Sistemas Internacionais de Proteção aos Direitos Humanos

Caso Dezinho: O sindicalista José Dutra, o Dezinho, foi assassinado por causa de sua luta em nome dos trabalhadores rurais, em Rondon do Pará, em 2000. O crime teve repercussão nacional e internacional, chegando a ser analisado pela Organização dos Estados Americanos (OEA). Em dezembro de 2010, o governo brasileiro assinou um acordo com a OEA assumindo sua responsabilidade pelo assassinato de Dezinho e também oferecendo garantias aos seus familiares. A viúva de Dezinho, Maria Joel Costa, conhecida como Joelma, os advogados do caso e organizações de Direitos Humanos afirmam que há imensas dificuldades em conseguir a investigação de todos os envolvidos na morte, assim como a garantia da segurança da família e de outros militantes pela reforma agrária no Pará. Joelma, por exemplo, já sofreu tentativas de assassinato. Parte dos participantes do assassinato já foram julgadas e condenadas em 2014. A situação em Rondon e em outras cidades do Pará, todavia, continua violenta, com muitos conflitos na luta por terra.

Caso Almir Muniz: O trabalhador rural  Almir Muniz da Silva desapareceu em junho de 2002, quando tinha 40 anos. O trator em que ele trabalhou naquele dia foi encontrado com marcas de tiros em Itambé, cidade na divisa entre Paraíba e Pernambuco, conhecida como “fronteira da morte” por causa do alto número de assassinatos de trabalhdores. No dia seguinte, a família fez o registro de ocorrência. Em abril de 2009, o caso foi arquivado, e os parentes ficaram sem explicação. A Justiça Global e outras organizações enviaram petição à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH)  por violações cometidas por agente do Estado e omissão nas investigações. Engajado na luta pela terra, Almir alertou, em 2001, a Assembleia Legislativa da Paraíba sobre a formação de milícias que contavam com o conhecimento de agentes do Estado.

Caso Antonio Tavares: A omissão da Justiça brasileira diante de uma violenta repressão da Polícia Militar contra uma marcha do Movimento dos Sem Terra (MST) no Paraná, em maio de 2000, levou à morte do agricultor Antonio Tavares, de 37 anos, vítima do projétil disparado por um PM. O atirador obteve a indulgência do tribunal militar e conseguiu um habeas corpus para trancar a ação penal na Justiça comum, com base na decisão anterior da Justiça Militar. A denúncia foi feita pela Justiça Global à Comissão Interamericana de Direitos Humanos em 2010. A denúncia foi aceita pela comissão que, em relatório de outubro de 2009  recrimina o País por confiar a apreciação do processo a uma corte militar, a despeito das orientações da OEA.

Caso Escher: A Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA condenou o Brasil a pagar indenizações a trabalhadores rurais que tiveram suas ligações telefônicas grampeadas irregularmente. O caso havia sido denunciado à OEA em 2000 pelo MST, pela Comissão Pastoral da Terra e pelas organizações Justiça Global, Terra de Direitos e Rede Nacional de Advogados Populares (RENAP). Em agosto de 2009, o Estado brasileiro foi considerado culpado pela instalação dos grampos, pela divulgação ilegal das gravações e pela não-responsabilização dos envolvidos. Em maio de 1999, o então major Waldir Copetti Neves, oficial da Polícia Militar do Paraná, solicitou à juíza Elisabeth Khater, da comarca de Loanda, no noroeste do estado, autorização para grampear linhas telefônicas de cooperativas de trabalhadores ligadas ao MST. A juíza autorizou a escuta imediatamente, sem qualquer fundamentação, sem notificar o Ministério Público e ignorando o fato de não competir à PM investigação criminal. Durante 49 dias os telefonemas foram gravados. A falta de embasamento legal para determinar a escuta demonstra clara intenção de criminalizar os trabalhadores rurais grampeados.

Caso Roberto Monte e Plácido Medeiros de Souza: A Comissão Interamericana de Direitos Humanos pediu ao Estado brasileiro que garantissem a segurança de Roberto Monte e Plácido Medeiros, defensores de direitos humanos que estavam sofrento graves ameaças de morte por parte de Jorge Luiz Fernandes, conhecido como “Jorge Abafador”, em Natal, Rio Grande do Norte. O pedido foi feito em 2001 por causa dos riscos que os dois sofreram ao denunciarem um grupo de extermínio formado por policiais conhecido como “meninos de ouro”, do qual Jorge fazia parte. A solicitação da CIDH foi feita após pedido da Justiça Global e outras organizações ao sistema interamericano. Na solicitação, a comissão também acata a sugestão das organizações de pedir a transferência de Jorge para um presídio de segurança máxima. Na época, ele podia sair da cadeia duas vezes por semana, o que lhe permitia articular a atuação do grupo de extermínio.

Caso Sebastião Camargo: O camponês sem terra Sebastião Camargo Filho foi morto em 1998, em Marilena, Noroeste do Paraná, por milícia privadas ligada à União Democrática Ruralista (UDR). O latifundiário Marcos Prochet, na época presidente da UDR, é um dos acusados pelo crime. O assassinato de Sebastião Camargo foi o primeiro de uma série de homicídios cometidos por pistoleiros: além dele, foram mortos Sétimo Garibaldi (1998), Sebastião da Maia (1999), Eduardo Anghinoni (1999) e Elias Gonçalves Meura (2004), entre outros trabalhadores. Os crimes marcaram um período de grande violência no campo na região Noroeste do estado, especialmente durante o governo Jaime Lerner. Em 2011, 11 anos após o assassinato do trabalhador rural Sebastião Camargo Filho no Paraná, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) responsabilizou o Estado Brasileiro pelas violações ocorridas do direito à vida, às garantias judiciais e à proteção judicial.

Caso Gilson Nogueira: O assassinato do advogado Gilson Nogueira, coordenador do Centro de Direitos Humanos e Memória Popular (CDHMP) do Rio Grande do Norte, aos 32 anos, ocorrido em 20 de outubro de 1996, na cidade de Macaíba, na região metropolitana de Natal, foi denunciado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que posteriormente levou o caso para a Corte Interamericana, em 2006. Aquel foi o primeiro julgamento na história do órgão sobre violações contra defensores de direitos humanos e o segundo caso brasileiro na corte. Gilson foi morto por denunciar a ação de um grupo de extermínio constituído por policiais civis da alta cúpula do estado, conhecido como “Meninos de Ouro”. Nogueira foi morto com três tiros, de um total de 17 disparados na cena do crime. No julgamento na Corte, o Estado brasileiro foi inocentado.

Caso Manoel Mattos: Em 2009, foi executado Manoel Mattos, advogado, ativista dos direitos humanos que lutava contra os grupos de extermínio na divisa dos Estados da Paraíba e Pernambuco. Seu caso ganhou repercussão nacional e internacional principalmente entre os anos de 2001 e 2007, momento em que colaborou para Comissões Parlamentares de Inquérito no âmbito dos estados e em sede nacional denunciando a execução sumária de quase 300 pessoas em um período de 10 anos na região que atuava. Em 2002, a Justiça Global e a Dignitatis Assessoria Técnica Popular encaminharam à Organização dos Estados Americanos (OEA) um pedido de medidas cautelares para a garantia da vida e da integridade física de Manoel Mattos e de outras quatro pessoas. A intenção era chamar a atenção do Estado brasileiro para as ameaças que vinham sofrendo e forçar não apenas que lhes fosse assegurada a proteção policial, mas que se iniciasse um trabalho eficaz de investigação a fim de desarticular os grupos de extermínio. A OEA prontamente concedeu as medidas cautelares, mas de nada adiantou: a falta de apuração e proteção possibilitou que, das cinco pessoas beneficiadas com as cautelares, duas tenham sido mortas (o primeiro foi Luiz Tomé da Silva, conhecido como “Lula”, um ex-pistoleiro que passou a colaborar com as investigações da CPI dos Grupos de Extermínio da Câmara, em 2003). Os participantes do assassinato de Manoel Mattos foram a julgamento em 2015.

Manoel Luiz da Silva: A Justiça Global, a Comissão Pastoral da Terra/PB e a Dignitatis acompanham mais o caso de Manoel Luís da Silva, que foi aceito na CIDH em 21 de outubro de 2006. O Estado brasileiro é acusado de omissão no homicídio do trabalhador rural, de 40 anos de idade, ocorrido no dia 19 de maio de 1997, quando um grupo de trabalhadores sem-terra foi atacado  quando voltava de uma mercearia localizada nas proximidades do acampamento do MST instalado na Fazenda Engenho Itaipu, que se encontrava sob processo de expropriação a título de utilidade pública com fins de reforma agrária. O agricultor José Caetano da Silva, 60 anos e o vaqueiro Severino Lima da Silva, estariam montados a cavalo e armados e depois de obrigar os sem-terra a largarem as foices que usavam como instrumento de trabalho, os acusados passaram a atacá-los. Durante o conflito, Manoel Luiz da Silva foi assassinado com tiros de espingarda calibre 12 e o sem-terra João Maximiniano da Silva foi ameaçado de morte. A Justiça Global enviou uma atualização sobre o caso em julho de 2015. Como o assassinato é anterior a 1998, o caso não poderá ir para a Corte Interamericana, pois o Brasil não havia ratificado a competência jurisdicional na mesma.