Em visita ao Brasil, Clément Voule, relator da ONU, aponta uma série de recomendações ao Estado brasileiro

ONU: Relator Clément Nyaletsossi Voule aponta uma série de recomendações ao Estado brasileiro 

 

Por Gizele Martins

Relator Clément Nyaletsossi Voule aponta uma série de recomendações ao Estado brasileiro
Relator Clément Nyaletsossi Voule aponta uma série de recomendações ao Estado brasileiro

Em visita ao Brasil, o relator da ONU sobre direitos à reunião pacífica e liberdade de associação, Clément Nyaletsossi Voule, declarou que: “encontrou no Brasil uma sociedade civil organizada e diversificada, mas que está sofrendo fortes ataques e ameaças por defender os direitos humanos”. Voule criticou os altos níveis de violência contra defensores de direitos humanos, comunicadores, jornalistas, lideranças indígenas, quilombolas e de favelas, que sofrem perseguição e retaliação por causa da luta na defesa dos direitos humanos e denúncia das violações em seus devidos territórios. Segundo Clément Voule, essas ameaças, intimidações e até censuras são também motivadas pelo racismo estrutural. 

 

Clémen Voule chamou atenção também para os ataques sistemáticos aos espaços de participação social promovidos pelo governo de Jair Bolsonaro. Segundo do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), 650 conselhos nacionais foram extintos desde 2019. “A extinção dos conselhos significa diminuir o espaço de diálogo da sociedade civil com o governo. É uma diminuição do espaço cívico, e eles precisam ser restabelecidos”, afirmou. Dentre diversos outros pontos colocados durante sua visita e na coletiva de imprensa realizada no último dia 08 de abril no Brasil, outro que foi destacado pelo relator foi sobre a descriminalização das drogas. 

 

Para ele, o discurso sobre a guerra às drogas serve como desculpa para que a política de segurança pública brasileira continue matando a juventude negra e pobre das favelas e periferias. «O protocolo de luta contra às drogas no Brasil está defasado. Eu diria que 80% dos casos de injustiça que eu encontro nesse país são sempre justificados pela guerra às drogas. É importante que seja revisado esse padrão de combate ao tráfico para garantir que não seja usado pela polícia para reprimir especialmente jovens negros. Há uma geração inteira de garotos negros que foram equivocadamente assassinados”, completou.

 

O Relator esteve em visita no Brasil entre os dias 28/03 e 08/04, onde se reuniu com autoridades, movimentos sociais e organizações em Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo. Durante sua visita, Voule buscou avaliar regras e medidas práticas para a realização de protestos e manifestações públicas. Ele também analisou mudanças relativas a campanhas políticas e liberdade de associação antes das eleições, o direito à participação em assuntos públicos e a situação de sindicatos.  

 

Em Brasília, o relator se reuniu com representantes da sociedade civil para discutir ameaças e ataques a organizações socioambientais, indígenas e quilombolas. Voule também realizou uma reunião com as Comissões de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, que contou com a participação de parlamentares das duas casas legislativas, ativistas e líderes de movimentos sociais. Realizou ainda conversas com a Procuradoria-Geral da República e com o Governo do Distrito Federal. Na Bahia, ele cumpriu agenda com autoridades locais e reuniu-se com aproximadamente 30 organizações e movimentos sociais e visitou três comunidades: quilombola, pesqueira e de religiões de matriz africana.

 

Já no Rio de Janeiro, Voule teve agenda com representantes do Ministério Público e da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro e com as chefias da Polícia Civil e Militar e reuniões com entidades da sociedade civil e parlamentares negras sobre a violência política e o contexto de conflitos sociais dentro do país, que ameaçam as instituições democráticas.

 

Em visita ao Conjunto de Favelas da Maré, na Zona Norte do Rio de Janeiro, ele participou de reuniões com entidades da sociedade civil que atuam na área de direitos humanos, comunicadores comunitários, familiares e vítimas de violência e terrorismo do Estado, além de lideranças do movimentos de favelas e periferias. 

 

Em São Paulo, a agenda incluiu a escuta de casos de perseguição e criminalização da atuação política e os desafios dos espaços digitais para a garantia e promoção das liberdades fundamentais. Além de reuniões específicas sobre a situação da comunidade artística no Brasil e com representantes do movimento negro.  

 

A visita do Relator Clément Nyaletsossi Voule foi organizada pelas organizações Artigo 19, Conectas, com apoio da Justiça Global, da Cese, do Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos, Anistia Internacional e Redes da Maré. O documento final com todas as recomendações será publicado em junho deste ano.