Federação Internacional de Direitos Humanos manifesta repúdio à classificação de vítimas como “narcoterroristas” pelo governador. Em “Moção das Américas”, 23 organizações integrantes do continente manifestam “total indignação” e exigem investigação independente.

Nesta quinta-feira (30), a Federação Internacional de Direitos Humanos se pronunciou sobre o massacre realizado nos complexos de favelas da Penha e do Alemão, na Zona Norte do Rio de Janeiro(RJ), no último dia 28. A FIDH exige das autoridades brasileiras, em especial do governo federal, uma investigação aprofundada sobre os fatos para identificar e julgar seus responsáveis políticos.
Também exige que o Estado brasileiro deve adote medidas urgentes e imediatas para os governos regionais cumprirem rigorosamente as determinações do Supremo Tribunal Federal (STF) que proíbem esse tipo de operação policial nas favelas. A manifestação foi assinada pelas organizações brasileiras que compõem a coalizão: o Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), a Justiça Global e a Justiça nos Trilhos.
O evento, classificado pela FIDH como um fato “sem precedentes na história de Brasil” e uma “violação explícita e grave dos direitos fundamentais”, motivou uma “moção das Américas” durante o 42º Congresso da FIDH em Bogotá, Colômbia, realizado entre 27 e 30 de outubro de 2025.
As organizações exigem uma investigação justa e independente para punir os responsáveis políticos e repudiam veementemente as declarações do governador Claudio Castro, que “ignorou as vítimas” ao se referir a todas elas como “narcoterroristas”. A FIDH, juntamente com suas organizações-membro no Brasil (MNDH, Justiça Global e Justiça nos Trilhos), aponta as autoridades políticas do Rio de Janeiro como as “máximas responsáveis” pela ação.
Leia na íntegra:
Brasil: repressão policial e massacre no Rio de Janeiro
Em um fato sem precedentes na história do Brasil, 132 pessoas foram assassinadas em uma operação policial nas favelas da Penha e do Alemão, no Rio de Janeiro, em que agentes utilizaram armas de fogo de forma indiscriminada. A FIDH, o Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), a Justiça Global e a Justiça nos Trilhos, suas organizações membro no Brasil, qualificam esse episódio doloroso não apenas como uma grave e explícita violação de direitos fundamentais, mas também apontam as autoridades políticas do Rio de Janeiro como principais responsáveis por essa ação premeditada e criminosa.
A FIDH repudia as declarações do governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, que ignorou as vítimas do massacre e se referiu a todas elas como “narcoterroristas”. Do mesmo modo, a federação rejeita veementemente a instrumentalização da violência e dos assassinatos como estratégia política para obtenção de ganhos eleitorais. O Estado tem o direito e o dever de combater o crime organizado, mas sempre respeitando o devido processo legal, e não por meio de execuções extrajudiciais, que no Rio de Janeiro deixaram de ser exceção para se tornar prática recorrente na política de segurança pública, baseada na lógica do confronto.
Esse episódio é mais um exemplo da crescente violência policial contra a população brasileira. O STF estabeleceu regras específicas para esse tipo de operação, que devem ser de conhecimento inclusive do Ministério Público. O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) atuou no caso e solicitou ao STF uma decisão — já publicada — que determina um conjunto de medidas específicas, ainda pendentes de cumprimento. Investigações justas, com perícia independente e amplo acompanhamento da sociedade civil e de órgãos de controle social, são fundamentais para que as responsabilidades sejam apuradas em profundidade.
“As ações de segurança pública devem proteger e garantir a vida, não destruí-la. Independentemente de quem seja, todas as pessoas têm direito a um processo justo. Não há razões, justificativas ou motivos que possam legitimar uma situação como esta. As autoridades responsáveis pela investigação devem exercer plenamente o papel que lhes cabe constitucionalmente. As apurações precisam ser conduzidas de forma independente, para que se faça justiça e, sobretudo, para que não se aja com precipitação”, afirmou Paulo César Carbonari, da coordenação nacional do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH).
Nesse contexto, esses acontecimentos trágicos evidenciam a racialização e a discriminação estrutural que afetam uma parcela significativa da população brasileira. No país, as vítimas da violência são, em sua maioria, jovens, negras e moradoras das periferias. Esse é o perfil das pessoas mortas pela violência. Soma-se a isso a polarização da sociedade brasileira e o avanço de discursos de extrema direita, que alimentam a hostilidade contra essas populações.
Federação Internacional de Direitos Humanos (FIDH), Justiça Global, Movimento Nacional de Direitos Humanos e Justiça nos Trilhos
30 de outubro de 2025
Moção das Américas sobre o Brasil
Os/as representantes das organizações que assinam esta moção, participantes do 42 Congresso da Federação Internacional de Direitos Humanos (FIDH), reunidos em Bogotá, manifestam, com força, sua total indignação ante o massacre de mais de 132 pessoas nas favelas da Penha e do Alemão no Rio de Janeiro, Brasil, em 28 de outubro. Exigem investigação justa e independente e orientada pelos direitos humanos de todos os que apostam no confronto com as populações pobres das favelas do Rio de Janeiro como política pública.
Os responsáveis por fatos tão graves precisam ser punidos por suas responsabilidades penais e administrativas. Por isso, esperam que o governo do Rio de Janeiro cumpra totalmente a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), atendendo a uma solicitação do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH).
As organizações que subscrevem manifestam a mais profunda solidariedade às famílias e comunidades afetadas. Também apoiam integralmente as organizações de direitos humanos, em especial às que são afiliadas à FIDH no Brasil, para que sigam atuando com independência e exigindo que o que ocorreu nunca mais se repita.
Bogotá, 31 de outubro de 2025
Movimento Nacional de Direitos Humanos – MNDH BrasilJustiça Global – BrasilJustiça nos Trilhos – BrasilObservatorio Ciudadano – ChileCAJ – ArgentinaComisión Mexicana de Defensa y Promoción de Derechos Humanos – MéxicoLiga Argentina de Derechos Humanos – ArgentinaCentro de Estudios Legales y Sociales – CELS ArgentinaCorporación de Promoción y Defensa de los Derechos del Pueblo – CODEPU ChileILSA – ColombiaAccion Ecológica – EcuadorAPRODEH – PeruLIMEDH – MéxicoIDHEAS – MéxicoCEDHU – EcuadorCEDAL Centro de Derechos y Desarrollo – PerúCentro de Políticas Públicas y Derechos Humanos – Perú EQUIDADCIPRODEH – HondurasPROVEA – VenezuelaCALDH – GuatemalaCentro Nicaragüense de Derechos Humanos – CENIDH, NicaraguaOrganización Femenina Popular – OFP ColombiaCAJAR – ColombiaCPDH – ColombiaCNDHRD – República DominicanaINREDH – Ecuador
Foto da capa: Dezenas de corpos são trazidos por moradores para a Praça São Lucas, na Penha, zona norte do Rio de Janeiro. Operação Contenção. Crédito: Tomaz Silva/Agência Brasil