Dois meses do Massacre de Pau D’Arco: um crime do Estado ainda em andamento

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Foto: Mario campagnani
Liderança do acampamento dos trabalhadores, Rosenildo foi executado após ameaças.

O Massacre de Pau D’Arco, no sul do Pará, completou dois meses nesta segunda-feira, dia 24 de julho. A Justiça Global vem acompanhando o caso desde o início, pressionando o Estado a responder rapidamente sobre as responsabilizações pela morte dos trabalhadores rurais, assim como na reparação aos familiares e companheiros de luta das vítimas. O que se vê, contudo, é um cenário de aumento da tensão na região. Desde o momento da morte das 10 pessoas pelas mãos das polícias militar e civil, dentro da Fazenda Santa Lúcia, a Justiça Global foi a público dizendo “o Estado brasileiro não só não promove a justiça como ainda é o principal agente da violência contra a organização e a luta popular no campo“. Mesmo com toda a repercussão do caso, nacional e internacionalmente, a falta de medidas ainda levou a uma nova vítima, Rosenildo Pereira de Almeida, conhecido como Negão, de 44 anos, uma das lideranças do acampamento dos trabalhadores, no dia 7 de julho.

Os riscos de que esse novo crime pudesse acontecer eram altos, como alertava a Justiça Global, a Comissão Pastoral da Terra (CPT), a Terra de Direitos e o Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos. Após o massacre, os trabalhadores voltaram a acampar às margens da fazenda, para continuar a luta dos que morreram pela reforma agrária. Nesse cenário, era óbvio que o Estado deveria ter dado suporte rápido para evitar novas mortes. “Sua luta pela reforma agrária, todavia, não teve nenhum suporte nem antes e nem depois do crime. O Estado do Pará até hoje não tomou nenhuma medida no sentido de garantir a vida de trabalhadoras e trabalhadores rurais ou para superar o conflito. Foi necessária a entrada da Polícia Federal para a realização de uma investigação mais isenta e rigorosa, já que as mortes ocorreram em uma ação de policiais militares e civis”, lembra a nota divulgada logo após a execução de Rosenildo, acrescentando: “O governo federal, por sua vez, continua sem uma política de reforma agrária nacional. Há anos, o número de assentamentos despenca, enquanto o de conflitos aumenta. Mesmo com o massacre na Fazenda Santa Lúcia, até hoje o Incra não se manifestou sobre o uso daquela terra para assentar as famílias acampadas. A inoperância do instituto é certamente uma das principais causas da vulnerabilidade daquelas pessoas e, agora, da morte de Rosenildo”.

O acompanhamento do caso pela Justiça Global também é feito de forma presencial no Sul do Pará, assessorando advogados, familiares e trabalhadores rurais envolvidos no caso. A perspectiva é de dar visibilidade ao andamento da apuração do caso. Quando se completou um mês do massacre, por exemplo, a organização estava em Redenção – maior cidade da região sul do Pará – acompanhando o ato por justiça  dos familiares das vítimas, lembrando “a rapidez na investigação é essencial especialmente pela situação de vulnerabilidade que se encontram os familiares e as testemunhas do caso. Atualmente, os 15 sobreviventes do massacre encontram-se escondidos, por causa do risco de serem intimidados ou mortos“.

As intimidações, todavia, não se restringem apenas às testemunhas, como a morte de Rosenildo deixou claro. Há informações, inclusive, de que existe uma lista de marcados para morrer na região. Sabendo disso, a Comissão Pastoral da Terra, a Justiça Global e a Terra de Direitos já oficiaram o Conselho Nacional de Direitos Humanos para que solicite ao governo federal a inclusão delas no Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH), assim como pela utilização da Polícia Federal para garantir a segurança do acampamento e dos ameaçados, uma vez que a Polícia Militar do Pará está diretamente envolvida no massacre.

No ofício enviado, as organizações afirmam também que “é preciso que o Incra nacional intervenha no caso para garantir um encaminhamento acerca do conflito fundiário. Há indícios de grilagem na área da fazenda Santa Lúcia, fazendo-se necessária a intervenção do Incra para realizar estudos de sua competência e tomar as medidas cabíveis. A investigação do caso, por si só, não colocará fim à situação de conflito pois é a questão fundiária que estrutura a violência na região”. A fazenda em questão está nas mãos da Família Babinski e, desde 2013, está em disputa.