
A empresa canadense quer instalar a maior mina de ouro ao ar livre do Brasil, em Volta Grande do Xingu, no Pará, e assedia juridicamente líderes comunitários, defensores de direitos humanos e ambientalistas.
VIA MOVIMENTO XINGU VIVO PARA SEMPRE
Em decisão publicada nessa quarta (14), o juiz de Direito Titular da Vara Única de Senador José Porfírio, Felippe José Silva Ferreira, extinguiu uma queixa-crime impetrada em agosto de 2023 pela mineradora canadense Belo Sun contra 33 pequenos agricultores, duas lideranças do Movimento Xingu Vivo, um pesquisador e a diretora da ONG Amazon Watch, entre outros.
Na queixa-crime, Belo Sun pedia a prisão em flagrante, busca e apreensão de bens utilizados para “prática criminosa”, armas e bloqueio das contas dos agricultores que organizaram um acampamento no PA Ressaca em protesto contra a cessão, pelo Incra, de 21 lotes do assentamento para a mineradora. As mesmas medidas foram demandadas contra quem estava apoiando ou apenas pesquisando o acampamento.
Em sua decisão, o juiz Felippe Ferreira afirmou que “a queixa-crime não está apta para os fins aos quais se destina”, e, portanto, foi rejeitada pela falta de condição para o exercício da ação penal. Diante disso, foi declarada extinta a punibilidade dos querelados e determinado o arquivamento dos autos.
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Segundo o Diogo Cabral, advogado que representou, em parceria com a Sociedade Paraense de Direitos Humanos, os acampados e o Movimento Xingu Vivo na ação, a decisão atendeu integralmente o pedido da defesa; ou seja: absolvição sumária dos defendentes, a extinção do processo por inépcia da inicial e ausência de justa causa para a persecução penal. Para ele, Belo Sun visou, sobretudo, intimidar defensores de direitos humanos por meio de demanda judicial.
Já o Xingu Vivo comemorou a decisão como uma comprovação de que apoiar a causa da reforma agrária, dos direitos humanos e dos direitos da natureza não é e não pode ser considerado crime. Para o Movimento, enquanto houverem ameaças aos povos da Volta Grande do Xingu, ao rio e às suas florestas, é dever do Xingu Vivo apoiar as lutas contra violações e violadores.
Luta por reforma agrária
Alvos da ação da mineradora canadense, os agricultores que organizaram um acampamento de sem-terra dentro do assentamento de reforma agrária PA Ressaca, estão desde junho de 2022 protestando contra o repasse de 21 lotes, destinados originalmente à produção de alimentos, à maior mina de ouro a céu aberto do país.
“Achamos que era um absurdo o Incra dar terra de assentamento pruma mineradora gringa enquanto a gente estava passando necessidades. Então resolvemos fazer essa luta pelos nossos direitos. Fizemos o acampamento, começamos a plantar e hoje as nossas roças estão a coisa mais linda. Tem milho, arroz, cupuaçu, cacau, macaxeira, galinha, tanta coisa boa. Já fomos cadastrados pelo Incra, que prometeu assentar a gente no PA Ressaca, e estamos apostando na justiça”, explica um dos agricultores processados.
O acordo entre o Incra e a mineradora, que alienou os 21 lotes do PA Ressaca para Belo Sun em dezembro de 2021, é alvo de dois processos judiciais. Acionadas pelo Movimento Xingu Vivo, no início de 2022 as Defensorias Públicas da União e do Pará entraram com uma Ação Civil Pública (ACP) contra o acordo, fato questionado também em processo do Tribunal de Contas da União (TCU).
“No primeiro caso, já temos uma decisão favorável à ACP das Defensorias. Ou seja, em dia 27 de novembro do ano passado, o juiz federal de Altamira anulou o acordo. Mas como coube recurso, o mérito está sendo discutido agora em segunda instância. Já em relação ao TCU, o Movimento Xingu Vivo entrou como amicus curiae no processo, que é uma forma de participação nossa pela qual podemos mandar documentos e outros materiais para defender a anulação do acordo também no Tribunal de Contas”, explica o advogado Diogo Cabral.