O relator especial para a Liberdade de Expressão da Organização dos Estados Americanos (OEA), Edison Lanza, acompanhado de Margarette Macaulay, também integrante da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, estão no Brasil para uma consulta com a sociedade civil para a construção de um relatório temático sobre Protestos Sociais e Direitos Humanos (a ser lançado em março de 2017). Em encontro com organizações da sociedade civil, no dia 24 de setembro, os representantes ouviram relatos sobre diversas questões, como as dificuldades enfrentadas pelos defensores de direitos humanos na luta pela garantia de seus territórios, com forte criminalização das manifestações.
A Justiça Global esteve com os dois na reunião, na qual a pesquisadora Alice De Marchi lembrou que o direito de protestar vem sendo sistematicamente violado, e de forma mais grave nas favelas, periferias e no campo. Os principais violadores são o Estado, através de suas forças de segurança. “Temos um Ministro da Justiça que declarou abertamente, logo após assumir o cargo, que promoveria, sim, a repressão a movimentos sociais e ‘de esquerda’, chegando a defender o uso de balas de borracha para o ‘controle de multidões’, e um exército que recém admitiu (no último dia 23 de setembro) empregar ‘operações de inteligência’ em manifestações. O que é inadmissível em um regime democrático, se faz possível graças à direção política do atual governo, que que instituiu a PNI (Política Nacional de Inteligência) através de decreto presidencial assinado no último dia 29 de junho”, afirmou Alice.
A Justiça global considera importante a conversa com os represantentes para que a sociedade civil leve ao âmbito internacional as denúncias sobre a violência e criminalização que têm sofrido defensoras e defensores de direitos humanos e o processo brutal de criminalização dos movimentos sociais em seus direitos à liberdade de expressão. O encontro de sábado serviu para que as organizações e movimentos da sociedade civil relatassem as situações vividas atualmente no país e ajudassem a relatoria a formular recomendações para o relatório temático.
“Dentre as recomendações que foram feitas no encontro, estão questões básicas, como a não utilização do código penal para criminalizar movimentos sociais (como já tem sido feito, com a de organização criminosa), a proibição de armas letais e a efetividade da regulação de armas menos letais no contexto de manifestações e o fim da prática de espionagem de movimentos sociais. Foram também sugeridas recomendações estruturais que o Brasil precisa enfrentar e que tocam o tema, tais como a desmilitarização das polícias e a democratização dos meios de comunicação. Destacamos ainda as recomendações de combate ao racismo institucional que atravessa forças de segurança e poder judiciário, combate à violência de gênero, que atinge de formas específicas as mulheres que exercem e defendem o direito ao protesto, e um urgente cumprimento dos parâmetros internacionais de direitos humanos por parte do estado brasileiro”, disse a pesquisadora.
Os representantes também tiveram um encontro com a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), do Ministério Público Federal. A procuradora federal dos Direitos do Cidadão Deborah Duprat pontuou o aumento no número de mortes de defensores de direitos humanos, incluindo comunicadores. De acordo com dados da Artigo 19, entre 2012 e 2015, o Brasil registrou 121 violações contra a liberdade de expressão de comunicadores. São assassinatos, tentativas de homicídio e ameaças contra jornalistas, radialistas e blogueiros devido ao exercício de suas funções.
A PFDC destacou que a única política pública voltada à proteção desses defensores, o Programa de Proteção de Defensores de Direitos Humanos (PPDDH), enfrenta vários problemas estruturais e, atualmente, está presente em somente quatro estados brasileiros. “Acerca da questão, é importante ressaltar o retorno da morte de defensores de direitos humanos por decapitação – prática que traz um forte caráter simbólico de silenciamento”, ressaltou Duprat.