Retrospectiva 2025 Justiça Global: vitórias e lutas no campo dos direitos humanos

No Brasil, 2025 será lembrado, infelizmente, como o ano da operação policial mais letal da história do país, que resultou na morte de 122 pessoas nos Complexos da Penha e do Alemão (RJ), e também pela frustração em torno da COP 30, cujos textos finais do pacote de decisões políticas de Belém não mencionaram a saída dos combustíveis fósseis. Ao mesmo tempo, há muito a ser contado sobre lutas, caminhos percorridos e, por que não dizer, conquistas alcançadas. Neste ano, a Corte Interamericana condenou o Estado brasileiro por violações aos direitos territoriais dos quilombolas de Alcântara (MA) e foi publicado o decreto que instituiu o Plano Nacional de Proteção a Defensoras e Defensores de Direitos Humanos. Convidamos nossas parceiras e parceiros, companheiras e companheiros, a revisitar conosco essa trajetória. Foi um ano de grandes desafios, mas também de resultados concretos, mesmo em um contexto profundamente adverso.

Baixe aqui o Relatório Anual 2024 da Justiça Global. O documento reúne os principais resultados, ações e fatos do ano em que a organização completou 25 anos. [Em inglês aqui em breve]

O primeiro semestre de 2025 foi histórico para a Justiça Global. A Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) condenou o Estado brasileiro em três casos em que a organização atuou como representante das vítimas. No caso Manoel Luiz, reconheceu a impunidade no assassinato do trabalhador rural, além da criação de um sistema nacional de dados sobre violência no campo. No caso Almir Muniz, responsabilizou o Estado pelo desaparecimento forçado do sindicalista e ordenou a tipificação do crime e a criação de um protocolo de busca de desaparecidos no país. Já no caso Quilombolas de Alcântara vs. Brasil, condenou o Brasil pelas violações aos direitos territoriais e culturais de 171 comunidades. A organização também participou da audiência do caso Mães de Cabo Frio vs. Brasil, que trata da morte de 96 recém-nascidos em clínica conveniada ao SUS em 1996, além da discriminação de gênero na saúde

Neste ano foi concluído o julgamento pelo STF da ADPF 635, ação que questiona a política de segurança pública adotada no Rio de Janeiro. O Supremo determinou a implementação de medidas para redução da letalidade policial. A Justiça Global atuou como amicus curiae no caso. Em outubro ocorreu a Operação Contenção, que representou um marco de enorme gravidade no cenário da segurança pública do Rio de Janeiro. Estivemos na Penha no dia seguinte ao massacre e, desde então, temos atuado em diversas frentes para a garantia de justiça e reparação. Apoiamos missões do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (CNPCT) e Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). Elaboramos um relatório técnico-jurídico sobre a operação, informes para a ONU e OEA e colaboramos na elaboração de petições apresentadas no âmbito da ADPF 635 ao STF sobre o caso.

No âmbito do sistema prisional e socioeducativo, a Justiça Global atuou no monitoramento e incidência sobre violações no sistema de privação de liberdade. Participou da audiência da Corte IDH sobre as medidas provisórias do Complexo Prisional de Pedrinhas (MA). Organizou o evento paralelo à 60ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, onde destacou a relação estrutural entre racismo e tortura no Brasil. Ainda no âmbito das Nações Unidas, enviamos informe técnico ao Subcomitê para a Prevenção da Tortura sobre os desafios do Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura. Também participamos de audiência na Câmara sobre a criação e o fortalecimento de mecanismos contra a tortura em todos os estados do país. Neste ano, a Justiça Global passou a integrar a mesa diretora do Conselho Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (CNPCT) e a assembleia geral da OMCT. Também lançou a campanha “Derrubar cadeias, derrubar senzalas” e realizou ações de formação sobre o uso de armas menos letais para movimentos sociais, representantes do sistema de justiça e de mecanismos de prevenção e combate à tortura

Na garantia dos direitos dos povos indígenas, a Justiça Global participou da missão do CNDH aos territórios Avá Guarani no Paraná, impactados pela  implantação da Usina de Itaipu. Participamos da audiência na CIDH que tratou das violações cometidas contra povos indígenas durante a ditadura militar no Brasil. Também construímos a visita de Arif Bulkan, então relator para os Povos Indígenas da CIDH, aos Guaranis e Kaiowás do Mato Grosso do Sul. A Justiça Global também participou de audiência sobre as medidas provisórias na Corte IDH do caso Munduruku, que trataram questões como o avanço da mineração, do garimpo ilegal e os efeitos do mercúrio na saúde das aldeias. 

 

A Justiça Global participou da construção do Seminário Regional sobre Direitos Humanos e Empresas: avanços e desafios para a América Latina, que culminou na audiência na Câmara para discutir o PL nº 572/2022, que propõe a criação de um marco legal sobre a responsabilidade de empresas em violações de direitos humanos. Também participou de uma série de atividades durante o IX Fórum Regional das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos. Durante todo ano, participou de ações de sensibilização pela ratificação do Acordo de Escazú, reforçando o compromisso com a proteção de defensoras e defensores ambientais e com os direitos humanos e socioambientais no Brasil.

 

Um dos momentos mais importantes do ano para a Justiça Global foi a assinatura do Decreto nº 12.710, que instituiu o Plano Nacional de Proteção a Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (PlanoDDH) como política de Estado. Elaborado pelo Grupo de Trabalho Técnico Sales Pimenta, com participação da Justiça Global, o Plano resultou também em um anteprojeto de lei para institucionalizar o Programa e o Sistema Nacional de Proteção. A publicação da Portaria Conjunta nº 6, agora em dezembro, estabeleceu o Plano de Ação do PlanoDDH até 2035 e criou um Comitê Interministerial para sua implementação, monitoramento e avaliação, representando um avanço na política de proteção. Ainda sobre proteção a DDHs, a Justiça Global promoveu o encontro internacional “Saberes, experiências e ferramentas para o trabalho em espaços de realocação de pessoas defensoras de direitos humanos na América Latina”.

A Justiça Global participou da COP 30 com uma agenda ampla e conectada às lutas territoriais. Atuou simultaneamente na zona oficial e em espaços paralelos conduzidos por movimentos sociais. Em Belém, tornou-se ainda mais evidente que é das comunidades, dos movimentos e dos territórios que emergem o que há de mais concreto na defesa da vida e da força capaz de enfrentar a crise climática com coragem, justiça e perspectiva de futuro.

Relatórios publicados pela Justiça Global em 2025 sobre a situação dos direitos humanos no Brasil e em outros países:

Ainda teríamos muito o que dividir, como os debates dos quais participamos no México, sobre crime organizado; na Argentina, acerca da situação dos direitos humanos na região; o intercâmbio do Comitê Brasileiro de Direitos Humanos, do qual participamos nas Filipinas; e a Campanha pela Biblioteca Mindjer, com o envio de mais de duzentos livros à Guiné-Bissau, iniciativa do CEPEMG-GB voltada ao fortalecimento do acesso a publicações em língua portuguesa, com foco em gênero e autorias femininas, entre outras ações relevantes realizadas ao longo do ano. Encerramos este boletim com a participação das mulheres negras da Justiça Global na Marcha das Mulheres Negras por Reparação e Bem Viver, reafirmando a convicção de que a luta por justiça, reparação e bem viver deve orientar nossos caminhos em 2026.

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