“Não há pena justa com tortura, maus-tratos, fome e desumanização”, denuncia Justiça Global em audiência do CNJ sobre o sistema prisional

Organização foi ouvida em audiência pública do plano Pena Justa, em Brasília, para apresentar propostas de melhorias para o sistema prisional no contexto de construção do plano nacional, por determinação da ADPF 347.

A coordenadora do programa de Violência Institucional e Segurança Pública da Justiça Global, Monique Cruz, defendeu medidas para a redução das violações de direitos humanos no sistema prisional brasileiro em audiência pública promovida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e o Ministério da Justiça e Segurança Pública.

O evento ocorreu em 29 e 30 de abril em Brasília–DF. Mais de 50 pessoas e entidades habilitadas fizeram contribuições para a construção do plano ‘Pena Justa’, para melhorar o sistema prisional brasileiro, atendendo às determinações contidas no julgamento, em outubro de 2023, da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 347, quando o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a violação massiva de direitos fundamentais dos presos.

Monique Cruz apresenta proposta em audiência pública sobre Pena Justa – ADPF 347, realizado no auditório do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Crédito: Rômulo Serpa/Agência CNJ

Em sua apresentação, Monique Cruz denunciou o silenciamento das instituições de Justiça antes às violações de direitos humanos praticadas no sistema de privação de liberdade, como a “pouca ou nenhuma informação sobre investigação, realização de perícias e menos ainda de responsabilização de casos de tortura e homicídios”. E reforçou a atenção às medidas de não-repetição e reparação na constituição do Plano Nacional.

“Outras medidas de urgência devem caminhar com a defesa da democracia considerando, fundamentalmente, a quem se destinam o Sistema Penal e o Sistema Carcerário brasileiro,  pessoas  secularmente impedidas de acessar (e demandar) direitos. Pessoas negras, mulheres em particular, têm sido vitimadas direta e indiretamente pelas escolhas políticas feitas no Brasil”, afirmou Monique Cruz

Considerando os casos em sistema prisional peticionados pela Justiça Global perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos – relacionados ao Complexo Prisional do Curado (PE) , a pesquisadora e assistente social apresentou 16 pontos considerados urgentes para o enfrentamento das repetidas violações:

  1. Arquivamento imediato de Projetos de Lei (no Congresso e casas legislativas) que visem a ampliação do rol punitivo e aumento da população privada de liberdade no Congresso e nos Estados;
  2. Proibição absoluta da privatização do sistema prisional;
  3. Suspensão de qualquer aplicação de recursos públicos para a criação de novas vagas e/ou estabelecimentos prisionais;
  4. Extinção de Forças Nacionais Penais de Intervenção, por exemplo, a FOCOPEN. As unidades Federativas já tem criadas e implementadas inúmeras forças táticas de intervenção;
  5. Abolição do uso de armamento letal no interior de unidades de privação de liberdade;
  6. Abolição do uso de armamentos menos letais como instrumento de tortura;
  7. Banimento do uso de lança-projetil cinético no interior de estabelecimentos de privação de liberdade;
  8. Retomada completa das audiências de custódia presenciais e com garantia de sua função original;
  9. Extinção da prisão provisória para crimes de baixo potencial ofensivo e posse de baixa quantidade de substâncias proibidas;
  10. Criação de metodologia e normativas de controle e transparência do uso de armamentos menos letais em instituições de privação de liberdade;
  11. Implementação efetiva de todas as medidas cautelares e provisórias da Comissão e da Corte Interamericana de Direitos Humanos;
  12. Ampliação e fortalecimento das políticas de prevenção e combate à tortura no país, com maior atenção à criação e fortalecimento dos mecanismos e comitês nacionais em acordo com o Protocolo Facultativo, OPCAT, especialmente no que tange à autonomia orçamentária e independência dos órgãos e das pessoas membras;
  13. Elaboração, destinação orçamentária e implementação de concursos públicos voltado ao reestabelecimento e ampliação das equipes técnicas, principalmente, das equipes de Serviço Social, Psicologia, Saúde e Pedagogia;
  14. Estabelecimento de padrão sobre contagem de vagas;
  15. Institucionalização e regulamentação nacional da aplicação do “Cômputo em dobro”, constante nas resoluções de novembro de 2018 dos casos do Complexo do Curado e do Instituto Plácido de Sá Carvalho;
  16. Garantia a ampla participação da sociedade civil e destinação orçamentária na elaboração, implementação e monitoramento sobre coleta, análise e publicização de dados sobre as pessoas privadas de liberdade, os sistemas Judiciário, Prisional e Socioeducativo visando o enfrentamento do racismo na aplicação de recursos e práticas institucionais.

Veja a apresentação:

 

A versão final do plano será apresentada ao STF em julho de 2024. Após validação pela Suprema Corte, o ‘Pena Justa’ deve ser o ponto de partida para a construção de 27 planos estaduais e distrital. Também está aberta, até 5 de maio, consulta pública para pessoas, entidades e organizações com atuação no campo penal.

Leia mais sobre o primeiro dia de audiência.

 

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